3.9.07

"É a Mídia, Estúpido!"

Por Alberto Dines, no Observatório da Imprensa.

A Tentação Totalitária

A semana que passou vai certamente inscrever-se de forma gloriosa na história do Judiciário. Mas na história da imprensa representou a continuação de um conflito que começou no ano passado e parece condenado a manter-se aceso por muito tempo. Quanto mais o governo, seu partido e seus aliados acusam a imprensa de parcialidade mais se amplia uma crise que tem tudo para ganhar conotações institucionais.
O erro desses falsos observadores da imprensa é presumir que jornalistas não têm brios profissionais nem consciência. Para os detratores da imprensa, o fotógrafo que faz um flagrante incômodo ou a repórter que registra uma conversa telefônica num restaurante não são profissionais zelosos, cônscios de seus deveres na busca de fatos. São mercenários, títeres nas mãos de interesses escusos que comandam a mídia.
A imprensa, para esses observadores, seria uma entidade abstrata, sem gente, sem alma, sem noção de cidadania, enquanto que os 40 denunciados pelo Ministério Público – e agora réus –, estes merecem solidariedade, apoio, compreensão.
Esta forma de desumanizar e diabolizar instituições assemelha-se àqueles espasmos que desde meados do século passado são conhecidos pelo nome de totalitarismo
.

Por Janio de Freitas, no mesmo site.

A Imprensa no Tribunal

Os incidentes que opuseram a Folha e O Globo e, de outra parte, ministros do Supremo Tribunal Federal, vão além das divergências em torno da publicação de diálogos e conceitos embaraçosos de ministros, sobre o julgamento do chamado mensalão. Não só ficaram mais conhecidos os ministros e os cenários internos dos julgamentos, sempre tão obscuros para a opinião pública, mas ainda emergiu alguma discussão sobre a imprensa e sua função, tão pouco examinadas e debatidas.
A confessada mágoa do ministro Eros Grau projetou-se, dos ministros que lhe presumiam os votos (e erraram), para o jornalismo que fotografou e publicou os emails que o citavam.
A imprensa recebeu parte de sua forte reação, lida no tribunal. Disse, a partir da afirmação de sua independência: "A sociedade e mesmo a imprensa não o sabem, mas o magistrado independente é autêntico defensor de ambos".
A imprensa, além de saber, tem necessidade vital do magistrado independente. Nem mesmo as redações se dão conta dos malabarismos feitos a cada dia, já quase automaticamente, mas nem por isso sem tensões desgastantes, para superar riscos legais e éticos, de teor ou de forma, a muito do que deve publicar. (Jornalistas estão, em quase todo o mundo, entre as duas ou três comunidades profissionais mais atingidas por males cardíacos, inclusive como causa de morte).
Embora mais importante, o momento seguinte de Eros Grau passou despercebido. Mal começáramos a descansar do "estilo" Sepúlveda Pertence, tão enrolado que chega a dar nó em frase, Eros Grau executou um salto triplo sem rede, e a moçada das redações nem pôde entender: "É mercê da prudência do magistrado independente que não resultam tecidas plenamente, por elas mesmas, as cordas que as enforcarão, as elites e a própria imprensa". O ministro faz um aviso gravíssimo. Trazido para a linguagem pobre deste recanto, comunica-nos, em tom definitivo, que a imprensa e as elites serão eliminadas por forças que, se ainda não se entrosaram de todo para o seu fim, é graças só aos magistrados independentes.
De certo ponto de vista que não o da imprensa, foi providencial a distração das redações, porque tal advertência por um ministro do Supremo merecia tratamento jornalístico à altura – e lá viria mais incidente. Nada de contrapartida ou equivalência para a opinião do ministro Gilmar Mendes: "Todos os dias julgamos questões sensíveis do ponto de vista político, e não estamos preocupados com a opinião dos senhores". Senhores, no caso, são os jornalistas.
Há quem veja aí um desprezo insultuoso e uma vazão de soberba. Ainda que a contragosto, no entanto, a despreocupação dos ministros dá ou daria ao jornalismo o que a ele mais convém. O poder, seja qual for a sua forma nas instituições, não é destinação do jornalismo, é objeto dele, é assunto. É para ser ouvido, fotografado, gravado, investigado, esmiuçado -e desvendado para que no conjunto social se formem a consciência de cidadania e suas manifestações.
Em um caso, ao menos um, a situação se complica entre a ausência total e o excesso de preocupação. O ministro Ricardo Lewandowski que anda por um restaurante a falar, tanto ao telefone como aos ouvidos circundantes, sobre intimidades do Supremo, é o mesmo a dizer que "todo mundo [no Supremo] votou com a faca no pescoço". Que faca? A imprensa que "acuou o Supremo".
Indagado, depois, sobre a faca, Ricardo Lewandowski disse: "Falei com relação a mim". Não, falou em "todo mundo", por diferentes maneiras, e não se justifica negá-lo. Indagado sobre a afirmação, ao telefone e aos ouvidos dos circunstantes, de que no Supremo "a tendência era amaciar para o Dirceu", disse: "Primeiro, eu não sei se usei a palavra amaciar". Note-se: não negou o sentido da frase, apenas ressalvou a palavra. Não faria diferença, portanto, se a palavra fosse abrandar, ou atenuar, ou relevar, por exemplo. Onde entra a imprensa?
A exposição extraordinariamente nervosa do seu voto fundamental sobre José Dirceu foi, logo se veria, o contrapeso único na resultado de 9 a 1 contra o denunciado. Pareceria até uma confirmação preventiva da denúncia de amaciamento, solitário embora. Logo, o ministro Ricardo Lewandowski fica a dever uma contribuição ao debate, tão necessário e apenas insinuado, sobre a função da imprensa. Deve o esclarecimento de pelo menos duas afirmações: "O que eu senti é que o Supremo foi submetido a uma pressão violentíssima da mídia / As pessoas [do Supremo] estavam extraordinariamente submetidas à mídia".
A ocasião é boa para dizermos, todos, onde e como "a culpa é da imprensa". Ou, como prefiro, quando e como a imprensa é jornalismo ou não é.

3 comentários:

Anônimo disse...

ameaças à liberdade de imprensa não são novidade nests tempos
Alguém se lembra dos projetos do Conselho Federal de Josnalismo e da ANCINAV (que iria "regular" a produção audiovisual do país)?

morenocris disse...

Juca, bom dia.

A chamada do post está demais...cuidado com a faca no pescoço...rsrs...

Essa briga com a imprensa é muito antiga. O latim está sendo trabalhado para termos acesso às informações, não só a mídia como o povo.

Mas veja o que nos aproximou, o celular...a internet...que fantástico, não é Juca?

"faca no pescoço"... "a mídia não entende nada"... e o bate-papo dos "superiores" por e-mail...já pensou isso em latim, heim Juca?

Viva o mundo globalizado.

A capa da Época e a matéria principal da revista desta semana
é sobre o ministro Joaquim Barbosa - "Ele não fechou os olhos"...e os outros não fecharam a boca... será que latiram?

Beijos.

Unknown disse...

...eheh. Aqui não tem essa de faca no pescoço. Só polêmica, para o bem de todos...rs
Bjs e bom dia.